Furdur por sua vez era um anão muito forte e de longas barbas acinzentadas. Ele trabalhou por muitos anos nas minas de extração de safira ao lado de Dorin e Ariana, pais de Durandir. Depois da batalha que teve com orcs que tentavam roubar a mina, o que resultou na morte dos pais de Durandir, resolveu abandonar a vida de minerador e abrir essa taverna na cidade. Durandir o ajuda desde muito jovem, ficando até altas horas da madrugada servindo a uns e outros que não conhecem o limite para a bebida.
Furdur estava na cozinha preparando os assados que serviria nesta noite em sua taverna enquanto Durandir se virava para atender sozinho a todas as mesas equilibrando a pesada bandeja com as tulipas de cerveja até a boca, como deveriam ser na taverna Espuma Prateada, passando pelos estreitos corredores de cadeiras com pessoas folgadas tomando quase todo o espaço.
A noite varou em muita comilança e muita bebida para todos os freqüentadores assíduos da taverna. Alguns bardos apareceram naquela noite entoando cantigas de vários lugares, o que resultou em uma grande roda de dançarinos bêbados que derrubavam suas bebidas enquanto balançavam seus corpos pelo pequeno salão improvisado.
Durandir, vez ou outra, se pegava imaginando os lugares magníficos descritos nas canções dos bardos e imaginava se um dia ele poderia vislumbrar esses lugares. Mas sua fantasia logo acabava com um berro do meio da multidão exigindo mais bebida.
Os bardos se foram, as pessoas de melhores costumes também acharam que estava na hora de voltar para o lar e assim a taverna foi se esvaziando. Mas, como de costume, alguns fregueses continuaram na taverna e não pareciam nem um pouco motivados a ir embora. Furdur pediu a Durandir que ficasse atendendo esses incômodos fregueses enquanto ele ia conferir o estoque e anotar as encomendas, pois nesta noite ele vendeu tanta bebida que talvez não tivesse o bastante para mais dois dias.
- Traga-nos mais cerveja, Durandir desbarbado. – disse um deles seguido de uma onda de gargalhadas dos quatro na mesa.
- Não vou ficar agüentando isso Ludi – disse baixinho o anão para algo ou alguém dentro de uma bolsa surrada de couro que estava sempre pendurada em seu pescoço – vou botá-los para correr se continuarem a me insultar.
- Calma, meu amigo. Não vai querer que Furdur brigue com você, não é? – respondeu uma voz fina de dentro da bolsa.
Durandir serviu a cerveja com a cara fechada e resmungando algumas coisas na linguagem anã que ele aprendeu com Furdur. Os quatro homens se entreolharam e deram uma risadinha sarcástica.
- Acalme-se, pequenino. Estávamos apenas brincando. Não queremos que um louco que conversa com seus pais mortos se aborreça. – disse o homem moreno com uma cicatriz enorme no rosto.
- É verdade – continuou o outro homem gordo depois de tomar um bom gole da cerveja – vai que eles venham se vingar da gente durante a noite. – e os quatro caíram na gargalhada.
Para Durandir aquelas palavras foram além do que ele podia agüentar. Com um salto rápido e preciso caiu por sobre o homem da cicatriz atacando-o com a pesada bandeja. Com o golpe o nariz do rapaz se quebrou fazendo com que o sangue jorrasse das narinas e provocando uma terrível dor que todos puderam apreciar com seu grito ensurdecedor. O homem gordo pulou por sobre o anão e o homem caídos, mas Durandir foi mais rápido saindo de cima do homem ensangüentado e deixando que o grande homem caísse por sobre o outro o esmagando contra o chão. Os outros dois já estavam em pé cada um com uma cadeira na mão prontos para atacar Durandir quando Furdur apareceu por trás deles com seu velho machado de batalha nas mãos.
- Não ousem fazer isso, seus ratos. – disse o velho anão com uma voz ameaçadora – Dêem o fora da minha taverna, vocês já beberam demais por esta noite.
Não demorou nada e os quatro estavam saindo correndo desesperados da taverna como se fugissem de um exercito de orcs. Apesar de Furdur já estar velho, suas glórias em combates eram espalhadas por todos os cantos da cidade e todas as pessoas o respeitavam como um bravo guerreiro.
- Sinto muito, Furdur – se desculpou o jovem anão – mas eles falavam de meus pais. Eu não podia permitir isso.
- Sei disso, meu garoto. Ouvi tudo o que falaram e acho até que você agüentou bastante – disse o velho colocando a mão no ombro do garoto – sinto muita falta de seus pais, sabia?
Aquelas palavras eram sinceras, e Durandir sabia muito bem disso. Todas as vezes que Furdur falava sobre seus velhos amigos ele se emocionava. Durandir se recorda até hoje do dia em que Furdur contou o que realmente aconteceu naquele dia na mina de Denestor. Era um grande dia, pois Dorin havia extraído a maior pedra de safira que o mundo já vira. Estavam todos empolgados e Denestor foi pessoalmente à mina para buscar a grande pedra. Foi então que o pior aconteceu. Um bando de orcs invadiu a mina atrás da pedra preciosa pegando todos de surpresa. Ariana correu com a pedra e a entregou para Denestor que covardemente fugiu em sua carruagem a deixando para trás desprotegida dos perigosos assaltantes. Dorin correu para salva-la e acabou sendo atingido por dois ferozes orcs com suas espadas. Ariana fora atingida na cabeça e morreu na hora. Depois que conseguiram se livrar das bestas, Furdur e os outros trabalhadores da mina correram em direção ao casal caído. Ariana estava morta, mas Dorin teve tempo de fazer um pedido a Furdur. – Cuide de meu filho, meu velho amigo. Não o deixe se meter em confusão – Furdur consentiu com a cabeça enquanto seus olhos transbordavam em lágrimas.
- Vá dormir Durandir. Deixe que eu me vire com essa bagunça aqui – o jovem anão nem teve tempo de dizer qualquer coisa e Furdur já o empurrava para seu quarto simples e aconchegante.
Ele entrou, fechou a porta e colocou sua bolsa em cima de sua velha cama de palha. De dentro saiu uma criatura pequenina com apenas quinze centímetros de altura. Aquele pequenino se chamava Ludivic, ou Ludi como costumava chama-lo o anão. Ludi apareceu quando Durandir era ainda muito jovem e desde então lhe faz companhia e o ajuda nas tarefas diárias quando Furdur não está por perto, pois é de sua natureza brownie não se mostrar para ninguém em quem ele não confie realmente.
- Já não podemos adiar, Ludi. Temos que agir ainda hoje. – cochichou o anão.
- Hoje? – se espantou o pequeno – Não acha que ainda é cedo demais para por em prática nosso plano?
- Cedo? A gente já vem planejando isso há dois anos. Já está mais do que na hora de agirmos. Não posso mais continuar espantando os fregueses de Furdur todas as vezes que brigo com alguém por insultarem a mim ou aos meus falecidos pais.
- Entendo. Acho que tem razão. Já repassamos o plano muitas vezes, portanto nada pode dar errado. – concordou Ludi estampando um sorriso confiante em seu pequenino rosto – Então pegue tudo o que precisa, pois não poderemos voltar.
- Sim, já está tudo preparado. Sabe, Ludi? Sentirei muita falta deste lugar. Espero que Furdur entenda que estou o deixando por uma boa causa, recuperar a jóia que me pertence por direito. A Jordariana – era como Durandir chamava a Safira DiLurien, uma jóia muito valiosa feita a partir da grande pedra que seu pai extraiu e que sua mãe se sacrificou para entregar a Denestor. Há anos atrás ele mandou transformar aquela pedra em uma linda jóia toda enfeitada de ouro e prata e deu de presente a sua esposa no aniversário de casamento. Sua esposa era uma mulher velha, magrela e demasiadamente mal humorada – Tenho certeza que ao ler minha carta ele irá compreender.
Os dois saíram sorrateiros pela pequena janela do quarto. Nessas horas é que Durandir era grato por não ser robusto como os outros da sua raça. Ludi estava em seu lugar dentro da bolsa do anão. Eles avançaram pelos becos escuros até a mansão Ardarum, residência de Denestor.
A casa era cercada por um muro bem alto, mas repleto de uma planta que gruda nas paredes dando a impressão de ser uma cerca viva. Durandir foi subindo se agarrando no vegetal que era forte o bastante para agüentar um anão magro e um brownie. Do outro lado do muro nada se via no jardim além das figuras de plantas enegrecidas pela escuridão que davam um aspecto aterrorizante para aquele lugar. A iluminação mais próxima era a das tochas na porta de entrada da casa ao fundo do terreno e eles não estavam com intenção de chegar até ela. Durandir foi o mais silencioso que pode, pois não queria despertar os cães de Denestor que atendiam a casa durante a noite.
Ao chegar a casa, Durnadir e Ludi avistaram as janelas que davam para os quartos da mansão. Elas ficavam bem altas no primeiro andar, porém esse não era o maior problema. Os dois não planejavam ficar vagando pela casa por muito tempo a fim de não serem pegos pelos vários empregados de Denestor. Tinham que ser precisos na escolha. Durandir iniciou a escalada e em menos de um minuto já estava na janela de um dos quartos. Ele olhou através dos vidros e nada viu.
- Acho melhor a gente tentar esse, Ludi. Pelo menos se não for o quarto não correremos o risco de ser pegos.
- Boa idéia. Aqui está seu grampo para abrir a janela. – disse Ludi lhe entregando uma ferramenta estranha de metal. O anão enfiou a fina ferramenta pela fresta da janela e com muita destreza conseguiu destravar as trancas do outro lado – Muito bem, meu amigo.
A janela se abriu rangendo um pouco e em seguida os dois pularam para dentro do quarto. Durnadir se desequilibrou e acabou caindo por cima de Ludi em sua bolsa. O brownie não pode conter um grito de dor, o que preocupou o anão imaginando que podia ter acontecido algo com seu amigo, mas tudo não passou de um susto. Sua atenção agora voltava para a Sra. Ardarum que, mesmo depois do berro de Ludi, dormia tranqüilamente em sua cama. Ele respirou aliviado pela sorte que teve em não despertá-la, porém estranhou a ausência de Denestor. Sem se importar com isso e, mais uma vez agradecendo pela boa sorte, foi logo para a cômoda onde se encontravam as jóias da mulher. Fuçou em todas as caixas e gavetas e não encontrou nada além de outras jóias que não lhe interessavam.
- Não é possível que não esteja aqui, Ludi. Será que eles guardam a Jordariana em um cofre?
- Acho pouco provável... – de repente Ludi parou de falar como se quisesse prestar a atenção em algo – Está ouvindo isso? Há vozes no quarto ao lado e parece ser do Sr. Denestor.
Os dois encostaram o ouvido na parede para poder ouvir melhor. Era realmente a voz de Denestor e ele não parecia estar só. As risadas e gemidos de uma mulher podiam ser ouvidos. Denestor dizia que a Safira ficava muito mais bonita naquela mulher até então desconhecida pelos dois companheiros.
- Então está com ele. O desgraçado deve ter dado algo para sua mulher dormir e então se deitou com uma qualquer e está usando a jóia dos meus pais para seduzi-la. – os olhos do anão pareciam estar pegando fogo enquanto ele falava aquelas palavras.
- Acalme-se! Devemos ser mais cuidadosos agora. Eu tenho um plano para tira-los do quarto. – Durandir o olhou curioso para saber qual seria o plano – Você sai pela janela e antes de fechá-la você imita a voz da esposa dele o chamando. Tenho certeza que ele sairá correndo do quarto e expulsará a mulher de lá. Assim eu entro e pego a jóia. Você fica me esperando na janela do quarto ao lado para descermos.
- Ótimo plano, Ludi. Vamos por em prática. Fique escondido na porta do outro quarto.
Ludi correu para o corredor enquanto Durandir foi saindo pela janela. O anão muitas vezes ouvia aquela mulher conversando no mercado enquanto ele fazia as compras para Furdur, e muitas vezes se divertia imitando algumas pessoas para Ludi que ria muito da bela interpretação do anão.
Quando Ludi finalmente estava pronto, o jovem anão deu continuidade ao plano – Denestor. Onde você está? Venha já aqui! – gritou o anão e rapidamente fechou a janela indo em direção a janela do quarto ao lado.
O plano de Ludi funcionou e rapidamente o homem saiu correndo do quarto expulsando a mulher de sua casa. Depois voltou correndo em seu quarto para ver sua esposa. O susto foi tão grande que ele acabou deixando a jóia sobre a cama e Ludi correu para lá e a pegou. O anão abriu a janela nesse momento e se divertiu vendo seu amigo desajeitado para carregar aquela safira que para ele era ainda muito maior que para qualquer pessoa. Quando finalmente Ludi chegou à janela, Durandir o pos junto com a jóia em sua bolsa e então iniciaram a descida. O anão estava tendo o máximo de cuidado, mas seu pé direito escorregou fazendo com que ele caísse de uma altura de três metros. O barulho acabou atraindo a atenção dos cachorros que vieram correndo em sua direção. Rapidamente o anão se levantou mais era tarde demais, os três cachorros enormes já haviam saltado sobre ele. Durandir então levou a mão ao rosto para se proteger das lambidas dos cães. Há mais de dois anos era Durandir que trazia a comida dos caninos e passava alguns minutos lhes fazendo afagos enquanto devoravam a suculenta refeição.
Mas não foi apenas a atenção dos cães que o anão havia atraído. O cocheiro estava dando os últimos tratos na carruagem de Denestor antes da viagem da manhã seguinte e ouviu o barulho do anão despencando da janela.
- Um pouco tarde para alimentar os cães, não acha Sr. Durandir? – interrogou o cocheiro intrigado pela presença do anão naquele horário.
- Não é isso. Não vim alimentá-los. – disse o anão tentando disfarçar seu nervosismo – Na realidade vim procurar uma coisa que esqueci aqui essa tarde quando vim trazer a comida deles.
- E encontrou? Precisa de ajuda para achar? – perguntou o homem desconfiado do anão.
- Sim. Achei sim. – respondeu rapidamente o jovem anão – Muito obrigado, mas eu já estava de saída.
- Não vá embora sem sua bolsa! – Com toda aquela confusão a bolsa de Durandir caiu de seu pescoço sem ele perceber. Seu rosto de preocupação ao ver o homem segurando sua bolsa aberta e olhando para o interior dela foi realmente impressionante. – É uma boa bolsa, meu rapaz! Surrada, porém muito boa. Tome-a!
Durandir a pegou e quase não conseguiu segura-la direito de tanto tremer. A bolsa estava vazia e ele suspirou aliviado e ao mesmo tempo se preocupou com seu amigo e sua tão preciosa jóia.
- Agora eu preciso realmente ir. Até mais ver.
- Até, Durandir. Tome cuidado para não perder mais seus pertences, certo?
- Certo. Tomarei mais cuidado. – disse o anão se despedindo do cocheiro.
Durandir saiu pelo portão que o cocheiro havia destrancado. Ao sair ele novamente olhou para o interior da bolsa e lá estava Ludi e sua Jordariana. Sua felicidade foi muito grande ao ver seu pequeno amigo são e salvo junto de seu maior tesouro que pra ele não tem preço.
- Como é bom te ver, meu amigo. Como fez isso? – perguntou ele sorrindo para o brownie.
- Segredos da minha raça. – respondeu Ludi dando uma piscadela.
- Temos dinheiro o bastante para chegarmos até a próxima cidade e resolver qual será nosso destino. – disse o anão olhando em volta como se quisesse guardar aquela imagem na sua cabeça – Sentirei falta deste lugar, Ludi. Mas não das pessoas. Bem, pelo menos não da maioria.
- Vamos Durandir, temos um longo caminho pela frente. Ao amanhecer é bom estarmos bem longe daqui.
E os dois foram embora pela estrada escura em busca de seu destino. Há quem diria que o jovem anão jamais colocou as mãos na jóia e que Ludi era apenas fruto de sua imaginação. Mas na realidade nunca saberemos, pois Furdur jamais contaria a verdade sobre o repentino sumiço de Durandir a quem quer que viesse perguntar. A esposa de Denestor jamais diria a alguém que fora roubada a fim de preservar a imagem de que sua casa é muito segura e para que não atraísse o interesse de outros ladrões. Denestor por sua vez não acusaria a mulher com quem se deitara naquela noite justamente para que sua esposa não soubesse e seu casamento se acabasse por conta de uma mulher qualquer. E claro, o cocheiro jamais diria uma palavra sobre o garoto ter ido à mansão naquela noite, pois seu patrão jamais o perdoaria por tê-lo deixado fugir.
Furdur estava na cozinha preparando os assados que serviria nesta noite em sua taverna enquanto Durandir se virava para atender sozinho a todas as mesas equilibrando a pesada bandeja com as tulipas de cerveja até a boca, como deveriam ser na taverna Espuma Prateada, passando pelos estreitos corredores de cadeiras com pessoas folgadas tomando quase todo o espaço.
A noite varou em muita comilança e muita bebida para todos os freqüentadores assíduos da taverna. Alguns bardos apareceram naquela noite entoando cantigas de vários lugares, o que resultou em uma grande roda de dançarinos bêbados que derrubavam suas bebidas enquanto balançavam seus corpos pelo pequeno salão improvisado.
Durandir, vez ou outra, se pegava imaginando os lugares magníficos descritos nas canções dos bardos e imaginava se um dia ele poderia vislumbrar esses lugares. Mas sua fantasia logo acabava com um berro do meio da multidão exigindo mais bebida.
Os bardos se foram, as pessoas de melhores costumes também acharam que estava na hora de voltar para o lar e assim a taverna foi se esvaziando. Mas, como de costume, alguns fregueses continuaram na taverna e não pareciam nem um pouco motivados a ir embora. Furdur pediu a Durandir que ficasse atendendo esses incômodos fregueses enquanto ele ia conferir o estoque e anotar as encomendas, pois nesta noite ele vendeu tanta bebida que talvez não tivesse o bastante para mais dois dias.
- Traga-nos mais cerveja, Durandir desbarbado. – disse um deles seguido de uma onda de gargalhadas dos quatro na mesa.
- Não vou ficar agüentando isso Ludi – disse baixinho o anão para algo ou alguém dentro de uma bolsa surrada de couro que estava sempre pendurada em seu pescoço – vou botá-los para correr se continuarem a me insultar.
- Calma, meu amigo. Não vai querer que Furdur brigue com você, não é? – respondeu uma voz fina de dentro da bolsa.
Durandir serviu a cerveja com a cara fechada e resmungando algumas coisas na linguagem anã que ele aprendeu com Furdur. Os quatro homens se entreolharam e deram uma risadinha sarcástica.
- Acalme-se, pequenino. Estávamos apenas brincando. Não queremos que um louco que conversa com seus pais mortos se aborreça. – disse o homem moreno com uma cicatriz enorme no rosto.
- É verdade – continuou o outro homem gordo depois de tomar um bom gole da cerveja – vai que eles venham se vingar da gente durante a noite. – e os quatro caíram na gargalhada.
Para Durandir aquelas palavras foram além do que ele podia agüentar. Com um salto rápido e preciso caiu por sobre o homem da cicatriz atacando-o com a pesada bandeja. Com o golpe o nariz do rapaz se quebrou fazendo com que o sangue jorrasse das narinas e provocando uma terrível dor que todos puderam apreciar com seu grito ensurdecedor. O homem gordo pulou por sobre o anão e o homem caídos, mas Durandir foi mais rápido saindo de cima do homem ensangüentado e deixando que o grande homem caísse por sobre o outro o esmagando contra o chão. Os outros dois já estavam em pé cada um com uma cadeira na mão prontos para atacar Durandir quando Furdur apareceu por trás deles com seu velho machado de batalha nas mãos.
- Não ousem fazer isso, seus ratos. – disse o velho anão com uma voz ameaçadora – Dêem o fora da minha taverna, vocês já beberam demais por esta noite.
Não demorou nada e os quatro estavam saindo correndo desesperados da taverna como se fugissem de um exercito de orcs. Apesar de Furdur já estar velho, suas glórias em combates eram espalhadas por todos os cantos da cidade e todas as pessoas o respeitavam como um bravo guerreiro.
- Sinto muito, Furdur – se desculpou o jovem anão – mas eles falavam de meus pais. Eu não podia permitir isso.
- Sei disso, meu garoto. Ouvi tudo o que falaram e acho até que você agüentou bastante – disse o velho colocando a mão no ombro do garoto – sinto muita falta de seus pais, sabia?
Aquelas palavras eram sinceras, e Durandir sabia muito bem disso. Todas as vezes que Furdur falava sobre seus velhos amigos ele se emocionava. Durandir se recorda até hoje do dia em que Furdur contou o que realmente aconteceu naquele dia na mina de Denestor. Era um grande dia, pois Dorin havia extraído a maior pedra de safira que o mundo já vira. Estavam todos empolgados e Denestor foi pessoalmente à mina para buscar a grande pedra. Foi então que o pior aconteceu. Um bando de orcs invadiu a mina atrás da pedra preciosa pegando todos de surpresa. Ariana correu com a pedra e a entregou para Denestor que covardemente fugiu em sua carruagem a deixando para trás desprotegida dos perigosos assaltantes. Dorin correu para salva-la e acabou sendo atingido por dois ferozes orcs com suas espadas. Ariana fora atingida na cabeça e morreu na hora. Depois que conseguiram se livrar das bestas, Furdur e os outros trabalhadores da mina correram em direção ao casal caído. Ariana estava morta, mas Dorin teve tempo de fazer um pedido a Furdur. – Cuide de meu filho, meu velho amigo. Não o deixe se meter em confusão – Furdur consentiu com a cabeça enquanto seus olhos transbordavam em lágrimas.
- Vá dormir Durandir. Deixe que eu me vire com essa bagunça aqui – o jovem anão nem teve tempo de dizer qualquer coisa e Furdur já o empurrava para seu quarto simples e aconchegante.
Ele entrou, fechou a porta e colocou sua bolsa em cima de sua velha cama de palha. De dentro saiu uma criatura pequenina com apenas quinze centímetros de altura. Aquele pequenino se chamava Ludivic, ou Ludi como costumava chama-lo o anão. Ludi apareceu quando Durandir era ainda muito jovem e desde então lhe faz companhia e o ajuda nas tarefas diárias quando Furdur não está por perto, pois é de sua natureza brownie não se mostrar para ninguém em quem ele não confie realmente.
- Já não podemos adiar, Ludi. Temos que agir ainda hoje. – cochichou o anão.
- Hoje? – se espantou o pequeno – Não acha que ainda é cedo demais para por em prática nosso plano?
- Cedo? A gente já vem planejando isso há dois anos. Já está mais do que na hora de agirmos. Não posso mais continuar espantando os fregueses de Furdur todas as vezes que brigo com alguém por insultarem a mim ou aos meus falecidos pais.
- Entendo. Acho que tem razão. Já repassamos o plano muitas vezes, portanto nada pode dar errado. – concordou Ludi estampando um sorriso confiante em seu pequenino rosto – Então pegue tudo o que precisa, pois não poderemos voltar.
- Sim, já está tudo preparado. Sabe, Ludi? Sentirei muita falta deste lugar. Espero que Furdur entenda que estou o deixando por uma boa causa, recuperar a jóia que me pertence por direito. A Jordariana – era como Durandir chamava a Safira DiLurien, uma jóia muito valiosa feita a partir da grande pedra que seu pai extraiu e que sua mãe se sacrificou para entregar a Denestor. Há anos atrás ele mandou transformar aquela pedra em uma linda jóia toda enfeitada de ouro e prata e deu de presente a sua esposa no aniversário de casamento. Sua esposa era uma mulher velha, magrela e demasiadamente mal humorada – Tenho certeza que ao ler minha carta ele irá compreender.
Os dois saíram sorrateiros pela pequena janela do quarto. Nessas horas é que Durandir era grato por não ser robusto como os outros da sua raça. Ludi estava em seu lugar dentro da bolsa do anão. Eles avançaram pelos becos escuros até a mansão Ardarum, residência de Denestor.
A casa era cercada por um muro bem alto, mas repleto de uma planta que gruda nas paredes dando a impressão de ser uma cerca viva. Durandir foi subindo se agarrando no vegetal que era forte o bastante para agüentar um anão magro e um brownie. Do outro lado do muro nada se via no jardim além das figuras de plantas enegrecidas pela escuridão que davam um aspecto aterrorizante para aquele lugar. A iluminação mais próxima era a das tochas na porta de entrada da casa ao fundo do terreno e eles não estavam com intenção de chegar até ela. Durandir foi o mais silencioso que pode, pois não queria despertar os cães de Denestor que atendiam a casa durante a noite.
Ao chegar a casa, Durnadir e Ludi avistaram as janelas que davam para os quartos da mansão. Elas ficavam bem altas no primeiro andar, porém esse não era o maior problema. Os dois não planejavam ficar vagando pela casa por muito tempo a fim de não serem pegos pelos vários empregados de Denestor. Tinham que ser precisos na escolha. Durandir iniciou a escalada e em menos de um minuto já estava na janela de um dos quartos. Ele olhou através dos vidros e nada viu.
- Acho melhor a gente tentar esse, Ludi. Pelo menos se não for o quarto não correremos o risco de ser pegos.
- Boa idéia. Aqui está seu grampo para abrir a janela. – disse Ludi lhe entregando uma ferramenta estranha de metal. O anão enfiou a fina ferramenta pela fresta da janela e com muita destreza conseguiu destravar as trancas do outro lado – Muito bem, meu amigo.
A janela se abriu rangendo um pouco e em seguida os dois pularam para dentro do quarto. Durnadir se desequilibrou e acabou caindo por cima de Ludi em sua bolsa. O brownie não pode conter um grito de dor, o que preocupou o anão imaginando que podia ter acontecido algo com seu amigo, mas tudo não passou de um susto. Sua atenção agora voltava para a Sra. Ardarum que, mesmo depois do berro de Ludi, dormia tranqüilamente em sua cama. Ele respirou aliviado pela sorte que teve em não despertá-la, porém estranhou a ausência de Denestor. Sem se importar com isso e, mais uma vez agradecendo pela boa sorte, foi logo para a cômoda onde se encontravam as jóias da mulher. Fuçou em todas as caixas e gavetas e não encontrou nada além de outras jóias que não lhe interessavam.
- Não é possível que não esteja aqui, Ludi. Será que eles guardam a Jordariana em um cofre?
- Acho pouco provável... – de repente Ludi parou de falar como se quisesse prestar a atenção em algo – Está ouvindo isso? Há vozes no quarto ao lado e parece ser do Sr. Denestor.
Os dois encostaram o ouvido na parede para poder ouvir melhor. Era realmente a voz de Denestor e ele não parecia estar só. As risadas e gemidos de uma mulher podiam ser ouvidos. Denestor dizia que a Safira ficava muito mais bonita naquela mulher até então desconhecida pelos dois companheiros.
- Então está com ele. O desgraçado deve ter dado algo para sua mulher dormir e então se deitou com uma qualquer e está usando a jóia dos meus pais para seduzi-la. – os olhos do anão pareciam estar pegando fogo enquanto ele falava aquelas palavras.
- Acalme-se! Devemos ser mais cuidadosos agora. Eu tenho um plano para tira-los do quarto. – Durandir o olhou curioso para saber qual seria o plano – Você sai pela janela e antes de fechá-la você imita a voz da esposa dele o chamando. Tenho certeza que ele sairá correndo do quarto e expulsará a mulher de lá. Assim eu entro e pego a jóia. Você fica me esperando na janela do quarto ao lado para descermos.
- Ótimo plano, Ludi. Vamos por em prática. Fique escondido na porta do outro quarto.
Ludi correu para o corredor enquanto Durandir foi saindo pela janela. O anão muitas vezes ouvia aquela mulher conversando no mercado enquanto ele fazia as compras para Furdur, e muitas vezes se divertia imitando algumas pessoas para Ludi que ria muito da bela interpretação do anão.
Quando Ludi finalmente estava pronto, o jovem anão deu continuidade ao plano – Denestor. Onde você está? Venha já aqui! – gritou o anão e rapidamente fechou a janela indo em direção a janela do quarto ao lado.
O plano de Ludi funcionou e rapidamente o homem saiu correndo do quarto expulsando a mulher de sua casa. Depois voltou correndo em seu quarto para ver sua esposa. O susto foi tão grande que ele acabou deixando a jóia sobre a cama e Ludi correu para lá e a pegou. O anão abriu a janela nesse momento e se divertiu vendo seu amigo desajeitado para carregar aquela safira que para ele era ainda muito maior que para qualquer pessoa. Quando finalmente Ludi chegou à janela, Durandir o pos junto com a jóia em sua bolsa e então iniciaram a descida. O anão estava tendo o máximo de cuidado, mas seu pé direito escorregou fazendo com que ele caísse de uma altura de três metros. O barulho acabou atraindo a atenção dos cachorros que vieram correndo em sua direção. Rapidamente o anão se levantou mais era tarde demais, os três cachorros enormes já haviam saltado sobre ele. Durandir então levou a mão ao rosto para se proteger das lambidas dos cães. Há mais de dois anos era Durandir que trazia a comida dos caninos e passava alguns minutos lhes fazendo afagos enquanto devoravam a suculenta refeição.
Mas não foi apenas a atenção dos cães que o anão havia atraído. O cocheiro estava dando os últimos tratos na carruagem de Denestor antes da viagem da manhã seguinte e ouviu o barulho do anão despencando da janela.
- Um pouco tarde para alimentar os cães, não acha Sr. Durandir? – interrogou o cocheiro intrigado pela presença do anão naquele horário.
- Não é isso. Não vim alimentá-los. – disse o anão tentando disfarçar seu nervosismo – Na realidade vim procurar uma coisa que esqueci aqui essa tarde quando vim trazer a comida deles.
- E encontrou? Precisa de ajuda para achar? – perguntou o homem desconfiado do anão.
- Sim. Achei sim. – respondeu rapidamente o jovem anão – Muito obrigado, mas eu já estava de saída.
- Não vá embora sem sua bolsa! – Com toda aquela confusão a bolsa de Durandir caiu de seu pescoço sem ele perceber. Seu rosto de preocupação ao ver o homem segurando sua bolsa aberta e olhando para o interior dela foi realmente impressionante. – É uma boa bolsa, meu rapaz! Surrada, porém muito boa. Tome-a!
Durandir a pegou e quase não conseguiu segura-la direito de tanto tremer. A bolsa estava vazia e ele suspirou aliviado e ao mesmo tempo se preocupou com seu amigo e sua tão preciosa jóia.
- Agora eu preciso realmente ir. Até mais ver.
- Até, Durandir. Tome cuidado para não perder mais seus pertences, certo?
- Certo. Tomarei mais cuidado. – disse o anão se despedindo do cocheiro.
Durandir saiu pelo portão que o cocheiro havia destrancado. Ao sair ele novamente olhou para o interior da bolsa e lá estava Ludi e sua Jordariana. Sua felicidade foi muito grande ao ver seu pequeno amigo são e salvo junto de seu maior tesouro que pra ele não tem preço.
- Como é bom te ver, meu amigo. Como fez isso? – perguntou ele sorrindo para o brownie.
- Segredos da minha raça. – respondeu Ludi dando uma piscadela.
- Temos dinheiro o bastante para chegarmos até a próxima cidade e resolver qual será nosso destino. – disse o anão olhando em volta como se quisesse guardar aquela imagem na sua cabeça – Sentirei falta deste lugar, Ludi. Mas não das pessoas. Bem, pelo menos não da maioria.
- Vamos Durandir, temos um longo caminho pela frente. Ao amanhecer é bom estarmos bem longe daqui.
E os dois foram embora pela estrada escura em busca de seu destino. Há quem diria que o jovem anão jamais colocou as mãos na jóia e que Ludi era apenas fruto de sua imaginação. Mas na realidade nunca saberemos, pois Furdur jamais contaria a verdade sobre o repentino sumiço de Durandir a quem quer que viesse perguntar. A esposa de Denestor jamais diria a alguém que fora roubada a fim de preservar a imagem de que sua casa é muito segura e para que não atraísse o interesse de outros ladrões. Denestor por sua vez não acusaria a mulher com quem se deitara naquela noite justamente para que sua esposa não soubesse e seu casamento se acabasse por conta de uma mulher qualquer. E claro, o cocheiro jamais diria uma palavra sobre o garoto ter ido à mansão naquela noite, pois seu patrão jamais o perdoaria por tê-lo deixado fugir.
Autor: Rockão Gobi
Tema: Anão, ladino com um amigo, imaginário ou não, Brownie.
Desafiante: Bruno
Desafiante: Bruno